A Floresta

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Treinamento de Henri James Kurtz

Eu não conhecia muito do acampamento, então resolvi dar uma volta, e procurar um lugar bem calmo para treinar. Eu ouvira histórias sobre a Floresta. Todo tipo de história, para falar a verdade. Ouvira sobre monstros extremamente perigosos, grandes e poderosos, ouvira que esse lugar deveria ser somente frequentado, caso estivesse na companhia de alguém, e também ouvira que, algumas vezes, a tal Amber se embrenhava pela Floresta, atacando campistas desavisados. Bem, eu já estava ciente de tudo, então andaria com muito atenção pelo local.

Passei pela linha de árvores que delimitava o começo da floresta, e então dei uma boa olhada em volta. Parecia como um bosque qualquer. Mas acho que essa era a intenção. Forcei meus sentidos ao máximo, prestando atenção a qualquer movimento, qualquer ruído, e até mesmo qualquer cheiro. O bom de ser um Semideus, era que os cinco sentidos tradicionais eram muito mais aguçados, e também acabavam por ter um sexto sentido, que eu não sabia muito bem como funcionava, só sabia que ajudava muito na hora de qualquer combate. Devia ser algo a ver com o déficit de atenção.

Comecei a caminha por entre as árvores, e vez ou outra alguns pássaros piavam e voavam para longe. Alguns feixes de luz irrompiam por entre a copa espessa das altas árvores, sendo como raios amarelados que cortavam o ar, dando um tom muito bonito ao local. - Eu poderia passar muitos dias aqui, somente observando essa paisagem, se não soubesse os perigos que rondam essa floresta... - Disse a mim mesmo, em um tom baixo. Então um barulho não muito convencional irrompeu pela floresta. Alguns galhos sendo pisoteados e quebrados, o vento sendo cortado com rapidez, e um rugido gutural. Só tive tempo de olhar para a direita, e ver uma grande massa escura, com muitos dentes afiados, se jogando em minha direção. Arremessei-me para trás, batendo com as costas e a cabeça em uma árvore. Vi estrelas. "Maldito..." Com os olhos semi-cerrados, passei a mão direita na parte da trás da cabeça, esfregando o lugar que acertara na árvore.

Dei uma boa olhada para minha esquerda, onde o monstro bufava, e pude ver do que se tratava. Era uma espécie de cachorro, extremamente grande, com músculos pelo corpo todo, e seus pelos eram negros como a noite. Me lembrava uma pickup, daquelas que vemos na TV, passando por lama, rios, e todas as condições adversas. Certamente que aquele monstro também deveria passar por tudo aquilo, e deveria pesar um pouco mais que um pickup. Ele estava de costas, atordoado por ter chocado sua cabeça em uma rocha. Levantei-me, apoiando a mão esquerda no chão. Fiquei de frente para a besta, que ainda passava suas patas em seu fucinho, provavelmente sentindo um pouco de dor. - Ei! - Gritei, chamando a atenção daquele cão, para mim. Cerrei meu punho direito, apertando o anél em meu dedo, e então "αστραπή έξυπνο" (Relâmpago Sagaz) irrompeu em minha mão. Sua lâmina de Bronze Celestial brilhava, refletindo alguns poucos feixes de luz que incidiam sobre sua superfície. O monstro olhou para a arma, com os olhos vermelhos e sedentos de sangue. Escancarou sua boca, e novamente um rugido feroz tomou conta da floresta. Olhei para seus olhos, fitando-o com os meus, eletrizantes e azulados, devido ao estado do céu. Um sorriso malicioso surgiu em meu rosto, os pelos da nuca se eriçaram, e os músculos do meu corpo começaram a se contrair. Estava pra ser o começo de uma batalha de grandes proporções.

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Meu coração começou a bater mais forte. Eu o sentia quase a irromper do meu peito. Era a adrenalina sendo liberada em meu corpo. O monstro contraiu os músculos das patas traseiras, preparando-se para um impulso. Preparei-me já para a esquiva, e então o animal se lançou, em uma tentativa avassaladora de me abocanhar. Dei uma cambalhota para a esquerda, e brandi minha espada, tentando acertar o flanco direito do animal, com um corte de baixo para cima. Virei-me rapidamente, para ver se o havia acertado, e então algo me atingiu no peito, com uma força tremenda, me arremessando uns bons metros para trás. Choquei contra o chão, e ainda continuei rolando uns 2 metros, ficando de bruços. Virei-me de lado e levei a mão direita ao peito. "Acho que essa pancada quase me quebrou uma costela..." Pensei, analisando os danos que aquele golpe causara em mim. Olhei em volta, minha espada não estava ao meu alcance. Levantei-me, ainda com a mão no peito, com um pouco de dor. Minha expressão estava fechada, e eu já sentia um pingo de suor escorrendo pela lateral de meu rosto.

- Ok grandão, você quer brincar, não é? - Falei, dirigindo a palavra a besta, que me olhava, intrigada. - Então pode vir! - Gritei. Mais um rugido por parte do animal, que lançou-se novamente. Eu estava contando mentalmente os segundos, e acabara de dar o tempo em que meu anél retornaria a minha mão. Dito e feito, pressionei novamente o punho direito, e a espada se projetou. Corri na direção da fera, enquanto ela vinha, galopante contra mim. Girei meu corpo no sentido anti-horário, abaixando a cabeça para fugir da gigantesca pata negra, e então golpeei, acertando a pata esquerda, traseira, do animal. Um grunhido de dor. A fera lambeu o sangue de sua própria pata, que começara a escorrer, e então me fitou, com os olhos ainda mais raivosos.

Desta vez ela atacou mais cautelosa, projetando somente a pata dianteira, na tentativa de acertar meu rosto. Consegui desviar, fazendo um movimento para trás. Por poucos centímetros a fera não me arrancou o nariz. Brandi a espada e corri, indo em direção a uma pedra que estava ao lado do grande cão. Dei um salto, e com a perna esquerda tocando na pedra, me projetei na direção da cabeça do animal. Estava a poucos centímetros do golpe, que mirava acertar o olho esquerdo da besta, mas algo me acertou novamente. Desta vez eu pude ver o que tinha sido. A pata direita do animal me acertara no flanco esquerdo do corpo, me arremessando para longe, novamente. Bati com o corpo, em uma árvore, e uma dor lancinante veio de meu ombro direito. Cai sentado, e tentei mover meu braço direito. Meu ombro estava deslocado. "Era só o que me faltava..." Pensei, dando uma olhada, e vendo um pouco de sangue escorrer de meu braço esquerdo, onde uma das garras do animal me acertara.

Consegui erguer meu corpo, com um pouco de dificuldade, e novamente estava desarmado. Já estava ofegante, com meu peito arfando devido a respiração pesada. Nesse instante, havia folhas secas em meu cabelo, além de manchas de barro e sangue pela minha roupa, rosto e braços. Estendi a mão esquerda na direção do animal, com os dedos abertos, apontados na direção do mesmo. E então gritei, convocando alguma coisa que eu sentia dentro de mim. Senti uma corrente elétrica passando pelo meu corpo, mas ela não me agredia, somente senti um formigamento, e então eu pude ver alguns raios passando pelo meu braço, e se projetando de minha mão esquerda, indo na direção da cabeça do animal, atingindo-o na testa. A besta balançou a cabeça, tentando desvencilhar-se daquilo, que não durou mais do que 3 segundos. Senti meu braço mais pesado, e ele despencou, pendendo ao lado do meu corpo.

Minha visão começou a ficar um pouco turva, e as pálpebras mais pesadas. Me senti como Atlas. Como se eu estivesse com o peso do mundo em minhas costas. Meus joelhos fraquejaram, e então despenquei sobre eles, batendo-os contra o solo. Sentei-me sobre meus pés, e senti meus batimentos cardíacos a diminuírem. Estava prestes a desmaiar. O monstro, ao ver meu estado, deixou de lado sua fúria, e viu que sua vitória era quase certa. Aproximou-se de mim, cauteloso. Seu fucinho estava quase a tocar meu peito, e eu podia sentir seu hálito pútrido, e sua respiração pesada. Meu estômago deu um salto, e eu realmente senti que ia vomitar, mas consegui manter-me parado, para não sobressaltar a fera. Dando dois passos para trás, e abanando o cauda, a besta preparava-se para deliciar-se com seu jantar, e eu via meu fim bem próximo. Fechei os olhos, engoli em seco e esperei pelo pior.

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Antes que a fera me atacasse, uma voz familiar se aproximou, e então mãos quentes tocaram meu. Abri um pouco os olhos, pensando que estava no céu. Era uma visão muito linda. Suzannah estava parada a minha frente, com seus cabelos castanhos a balançarem, e seus lindos olhos a fitar-me. Ouvi ela a dizer sobre o fato da floresta ser solo dos primordiais, e ela me chamar de idiota, mas a única coisa que eu conseguir falar foi. - Olá... S-suzannah... Filha de Hécate. - Falei com algum esforço, e tossindo um pouco. Começava a escorrer sangue pela minha boca, devido a um corte feito em meu lábio. Tentei avisá-la sobre o cão do inferno, mas minha voz não saia. Então a garota viu a fera por si só. Dai em diante, não entendi muito bem os acontecimentos. Só sei que Suzannah dizimou a besta, sem muito esforço. "Ela é perfeita..." Pensei, vendo-a fazer todos os movimentos de combate, com leveza e força, ao mesmo tempo.

Por fim, ela veio até mim, e me levantou, do meu lado esquerdo. Tentei cooperar, usando toda força que me restava, em minhas pernas. Seu cabelo caíra pelo ombro, ficando ao lado de meu rosto. E pelos Deuses, como cheirava bem. Abri um sorriso meio torto, ainda com dor, ao ouví-la perguntar o que eu fazia ali. - Bem... n-ninguém m-me falou na-nada... - Tentei erguer a cabeça, olhando para ela, e então disse, fazendo um pouco mais de esforço. - A-ainda bem q-que você v-veio me salvar... - Fui obrigado a fazer uma pausa, para recuperar o fôlego, e lembrei-me daquele dia na praia. - M-minha guarda-costas. - Fiquei em silêncio então, respirando pesadamente, e usando todas as minhas forças para caminhar. Não sabia para onde estava indo, somente seguia Suzannah, já confiava nela cegamente.

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Seguia Suze pelo acampamento, meio sem saber pra onde iam, somente a acompanhava. Mas repentinamente, a garota mudou de rumo, dizendo que tinha um mau pressentimento. Eu, com minha vasta experiência convivendo com Suzannah, sabia que os pressentimentos da garota sempre queriam dizer alguma coisa. A última vez, eles a levaram até mim, e vale ressaltar que, se não fosse por esses pressentimentos, eu estaria morto. De qualquer forma, corri atrás dela, e lá estávamos nos novamente, entrando na floresta, lugar que ela falara ser territórios dos primordiais, e extremamente perigoso. Passei a segui-la mais de perto, até que paramos. Pude ver uma garota caída a nossa frente, e então a filha de Hécate correu até ela. Aproximei-me, pousando a mão em seu ombro, e ela então disse que a tal garota ainda estava viva. Tomei a dianteira e peguei a garota no colo, tirando-a dos braços de Suzannah, que deixava rolar lágrimas em sua face.

- Deixe que eu a carrego, você não está em condições. Agora concentre-se e me guie para fora da floresta. O que a atacou, ainda pode estar por perto, e além do mais, existem outros perigos por aqui, temos que ir o mais rápido possível! - Dito isso, Suzannah enxugou as lágrimas e foi em minha frente, me guiando para fora da floresta. A garota que eu carregava no colo estava com um punhal fincado no peito. Aquilo era um péssimo sinal. Uma pessoa a atacara, talvez a tal de Amber que todos falavam. Não parecia estar com nenhum osso quebrado. Menos mal. O sangue da garota manchava minha camiseta e meus braços, e isso queria dizer que tínhamos que ser ainda mais rápidos. Ela estava perdendo muito sangue.